Ao alcance
E foram nos dias mais calmos que
me vi numa agitação sem tamanho e, o que era pior para mim, sem explicação
alguma do motivo pelo qual a calmaria se instalava. Não era momento de
mantermos as coisas num ‘morno’ incomum. Se estávamos afundando, por que
deixaríamos acontecer sem nem ao menos lutarmos por isso?
Após mais uma discussão, apenas
me deito na cama esperando os batimentos do meu coração manterem de volta um
ritmo mais calmo. Meu semblante não muda... mais. Já não me entristeço como
antes e nem me abalo tanto. É bom, acho. Pelo menos não há desespero
escancarado.
Ainda que deitada e calma, o
travesseiro enche-se de lágrimas. Um choro baixo, sem menção de estar por ali,
apenas de passagem, como que lavando a consciência. Ou apenas para lembrar o
quão humana sou e que meus sentimentos estão mais vívidos do que eu pensava, ou
do que você acredita.
Pois é, nesta hora me vem à
cabeça a insinuação bastante direta que fez ao me apontar uma nítida falta de
interesse. Sinceramente, isso foi muito perturbador. Imagina se eu perderia
tempo com alguém ou algo que não fizesse questão? Numa maneira de entender e
então poder explicar-lhe tudo isso, penso mais um pouco, agora mais encolhida
do que antes... as lágrimas acabaram bem como o conforto quente que elas me
deixavam. Sobrou apenas a frieza de uma pós discussão que, na verdade, deveria
ser acalorada, afinal, pensamos num término, isso não é algo a se preocupar?
Deve ter pensado que, diferente
de outros tempos, minha brandura era sinal de que já não me importava mais.
Compreensível isso. Como se não tivesse mais pelo o que lutar. E sabe que, por
alguns minutos, perdida naquela discussão, sem nem ao menos escutar os
desaforos que saiam da sua boca... viajei, para longe, e foi bom! Como se meu
lugar não fosse mais ali. Inundei-me de felicidade ao imaginar que não era esta
a minha realidade. Sinto-me envergonhada apenas de pensar nisso, de lembrar que
tive esses pensamentos e desejos e vontades... sem você comigo? Como isso se
daria?
Por sentir-me desleal, abraço
meus joelhos, ainda deitada na cama. Queria o aconchego do meu próprio abraço,
perdoando-me por almejar coisa diferente. Desleal não só com você, mas com o
propósito que eu acreditei que tínhamos. E você não estava errado em sua
observação, eu queria ter ido embora, ou deixado que você tomasse a iniciativa
– apesar de não acreditar que o faria. E aqui eu encontro o que pode ser o
problema: nos temos como garantidos. Não há mais cuidados nem abraços
carinhosos nem beijos demorados nem... onde estávamos quando essa distância
ficou de vez?
Escuto batidinhas leves na porta.
Você pedindo para entrar, ou apenas mostrando que por ali ainda estava. Dou um
suspiro alto o suficiente para entender que também estou ali, reflexiva, e que,
sem nenhuma palavra a ser dita ainda, quer dizer que não tem permissão para
entrar. Levanto em seguida, abro o guarda-roupas e vejo a minha mala feita. Se
eu parar para pensar quando a deixei pronta volto a chorar! Num engolir seco,
desfaço-a. Guardo tudo em seu devido lugar. Inclusive os meus sentimentos. Os
mais apropriados ficam ao alcance dos pensamentos... À frente com isso! Há muito
ainda a se viver. Abater-se por situações rotineiras não nos fará melhores.
Ali percebi que a calmaria não
era indício de desistência. Não naquela noite, ainda. Era a força interior que
precisava de mais tempo para ressurgir. Resgatando os sentimentos que estavam
perdidos, por nós. Encosto a mão na maçaneta e, desta vez, o suspiro é
baixinho. É uma promessa a mim mesma: se ainda está latente há de se reviver
como presente!
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