Eu odeio você e essa é a forma mais legítima de mostrar que te quero

Eu odeio você. E isso acontece tão diariamente. Odeio estar perto de você. Cada vez que nos encontramos aumenta ainda mais o meu desgosto, e aqui vai parecer ambíguo: esse sentimento todo é justamente porque me faz sentir tão bem que chego a me culpar por isso.

Não quero te ver! Acaba por me chamar, por me aguçar os sentidos, me clamar presença e eu simplesmente vou. Não sei se é apenas o comando em si, o fato de mandar e eu deliberadamente só atender, até porque eu mesma o quero! Ou a lembrança do seu cheiro que perpetua em mim, que fica impregnado na minha pele a cada vez que toca sua, e isso me leva ao delírio em noites nas quais não estamos juntos. Pode ser também que é pelo fato de que me deseja, e isso com certeza me basta para encontros nus e nada silenciosos.

Eu odeio você só porque você me descobriu sozinho, sem que eu tivesse que impor qualquer detalhe à sua frente. Veio a mim como um presente, mais seu do que meu, sabemos! E ainda assim eu abro os braços como quem quer lhe dar sempre o que tem de melhor. Ainda que por alguns instantes...

Eu odeio a vontade que me dá de querer dormir com você, ao seu lado, em seus braços, no calor do seu corpo, na mesma cama, e isso ser absolutamente proibido e imoral. Como algo assim pode ser tão indecente?

Odeio que tenha me visto, me quisto e me chamado para si mesmo sabendo que não seria pra sempre. Nunca o é mesmo, mas nós... ah, nós jamais seremos e eu odeio isso.

A cada encontro sinto uma particularidade sua que não tinha nem notado antes, são descobertas que me despertam ainda mais desejo e isso é odiável. Parece que estão em mim, sempre, e eu tenho que esconder. Tenho que te esconder em mim, de mim, dentro de mim e me parece muito difícil. É uma vontade imensa de só sermos.

Odeio querer ser sua. De querer que passemos de estranhos a confidentes. Odeio entender que o que mais me afeta não é olhar pra você e parecer tão intocável (bem sabemos onde meus lentos toques já atingiram em seu corpo), mas parecer inalcançável. Aquele alcance que só os amantes (os que amam mesmo) podem fazer! Não nos amamos e eu odeio isso. Odeio mais porque deve ser justamente pela falta de amor é que somos desse tamanho, que temos essa ânsia por encontros mal marcados e imediatos.

Odeio ter essa sede por você que nunca cessa, imaginar o próximo encontro ainda que tenha acabado de fechar a porta do carro. Odeio perceber que a minha fome é a sua também e que alimenta a minha, e ficamos nesse ciclo apetitoso por tempos sem contabilidade. E isso também me faz odiar você: estarmos juntos há tempos sem nem poder contar as datas da forma mais piegas que se faz.

Me causa muito desconforto relembrar seus olhos percorrendo meu corpo após tirar a peça branca que me fez colocar, seu único pedido, aliás (ademais são exigências belas e impostas e que eu claramente faço sem pestanejar). Odeio reviver o seu toque em mim, sozinha, tentando imitar seus gestos em meu corpo e, com meu insucesso solitário, clamar por você momentaneamente... logo passa, sabemos.

Odeio ainda mais quando não me nega, não me afasta, quando diz pra mim que hoje dá para nos vermos. Que ousadia sua me querer tanto, fazer questão de mim, me seduzir somente com o tom da voz em palavras únicas e bobas e íntimas demais para que qualquer outro fale.

Odeio seu sorriso de canto, sinal de que me viu de longe, mas não pode manifestar totalmente e sabe bem que eu percebo esse sorrisinho leve; me deixa louca por não poder, também, mostrar que te vi e isso basta para o dia ser totalmente diferente.

Eu te odeio tanto por ter feito eu me ver novamente, eu me sentir mulher, desejada. Eu te odeio mais e mais por ter dado essa importância toda, por ter esse ímpeto singular pela minha presença, esse desejo descabido por mim e ainda assim, não nos dar espaço numa vida já preenchida e sem o menor sinal de mudança futura.

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