O meu sorriso é só meu

Quando entendi que há pessoas que se entregam cedo demais e outras que tardiamente se posicionam, decidi me manter em minha própria companhia. 

Essa decisão não foi rápida nem fácil, mas vital. 

Sabíamos, ambos sabíamos, que eu estava apaixonada por você, que fazia planos e desistia de outros para mantê-lo por perto. Que me colocava à sua disposição sem que, sequer, se preocupasse com possíveis perdas que eu pudesse ter por isso. Que eu cantarolava nossa música de forma mental e dançava em sua companhia mesmo que não estivesse presente. Que eu escrevia linhas cheias de amor em bilhetes que você nunca leria por simples desinteresse.

Então eu vi, eu entendi, que meu sentimento era apenas meu. Você não partilhava nem da ilusão do que poderíamos ser. Não o julgo, essa era a verdade com a qual você conseguia lidar. 

Eu via além. Eu torcia, numa esperança sólida, de que seu momento chegaria. Ou melhor, o meu momento, aquele em que você entenderia que sempre sentia algo, só estava incapaz de perceber.

E aconteceu. Tardiamente. Inoportunamente. Totalmente fora de hora. Isso porque eu me acostumei. E não foi ao hábito de não ser amada por você. Acostumei comigo, com a minha completa companhia.

Me acostumei a chegar em casa, abrir a porta com a minha própria chave, e não esperar que outro abra no seu devido tempo.

Me acostumei a ocupar a cama inteira, sem me preocupar em dividir lençóis nem meus cinco travesseiros.

Me acostumei a acordar cedo, sem medo de fazer barulhos indevidos para não despertar outros fora de hora.

Acostumei a tomar meu café preto ligeiramente e só me deleitar com o banquete após minha caminhada matinal.

Não cozinho mais aos domingos, me dou o privilégio de conhecer um restaurante diferente a cada almoço dominical de acordo com a minha própria vontade.

Escuto música alta no carro enquanto dirijo, sem rumo nem horário, e sem que ninguém mude a estação ou pule a playlist que eu mesma escolhi.

Não tiro mais o volume das notificações do celular, recebo e respondo mesmo que tarde da noite.

Me acostumei a programar minhas viagens ao longo do ano sem ter que encaixar na agenda de quem nem faz questão de estar junto comigo.

Me acostumei a viver feliz por mim mesma, sem esperar que veja ou sinta o mesmo; até porque me acostumei a não estar com você. A diferença é que desta vez o costume que eu mesma criei for por necessidade. Prefiro me habituar a tudo isso sem a sua presença a ficar com você me dando apenas o mínimo.

Acostumei a ser completa mesmo faltando um pedaço imenso do meu coração que, infantilmente, lhe entreguei e não soube pedir de volta. 

Pois fique! Me acostumei a preencher sozinha qualquer falta que você tenha causado. Isso porque eu preferi a paz de um amor próprio do que a constante agonia de ser apenas um lembrete de protocolo amoroso. 

Então não me venha, serodiamente, dizer que nutre qualquer sentimento equivalente ao meu. Já me habituei sem chance de me refazer por você. 

Me habituei a sorrir sozinha e isso, agora, é só meu.

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