Voraz ainda que silencioso

Será que eu perdi aquele mistério que lhe fez intrigado a ponto de querer  entender-me? Acho que esse ‘ar’ enigmático é o que nos move num primeiro momento, que nos dá vontade de desvendar o que quer que seja, só pelo prazer de descobrir o novo. 

Talvez seja por isso que hoje passo mais dias só do que com você: sou totalmente conhecida. Eu diria mesmo é que sou verdadeira, mas há quem goste de contrariar-me sobre meus próprios pensamentos, então simplifico dizendo que já me conhece por demais e pode ser isso que nos afetou.

Será? E mais, será que é só pra você que isso faz diferença. E quanto ao que você tem representado pra mim?

Pois bem, aqui vai mais um aviso do que uma mensagem melancólica de quem quer resolver as coisas, afinal, já falei que podíamos nos reconectar um milhão de vezes, mas isso só nos fazia perder-nos ainda mais; então, pense agora no caso de eu não querer mais resolver e sim fazer o mesmo com você. 

Sem que saiba, sem que veja, sem que sinta... apenas haverá um afastamento obrigatório, lento e, para mim, voraz ainda que silencioso.

Vou continuar te assistindo daqui, daqui mesmo, do seu lado. Vê-lo fazer o que quer, achar que está comandando a situação; será o camarote mais caro que pagarei: meu tempo está em jogo aqui.

Vou deixar vir até mim, abraçar-me com o pouco ânimo que tens por estes tempos, e lhe garanto que será suficiente. 

Vou deixar enganar-me quando diz que o atraso foi pelo horário apertado, que não há outro motivo para que seu destino final seja apenas realmente ao fim extremo do dia.

Vou olhar dissimuladamente para você, como se ainda tivesse latente algum sentimento bom, nem vai notar.

Vou continuar a lhe dizer minhas confidências mais fúteis desta vez; seu interesse (como o meu) não faz mais morada aqui.

Vai procurar-me nos lençóis secos da noite mais gélida deste lugar que um dia foi quente, e ainda assim estarei em corpo ali. Garanto, nada vai notar.

E quando fortalecida o suficiente eu estiver; quando eu já tiver colocado em dia todo o meu pranto caótico e pessoal; neste dia sim, não estarei mais. Neste dia haverá apenas o silêncio de uma casa vazia. Pois não sabemos que o silêncio em sua real natureza dá lugar certo à todos os sentimentos?  

Aproveite então o tempo silencioso que sempre procurou. Palavras, ditas ou escritas, são incomodativas porque traduzem sentimentos, e é uma das coisas que mais tem medo, não é? 

Sou feita de estímulos diversos, frases soltas, textos inteiros... você não se dá ao trabalho de rascunhar qualquer bobagem que seja.

Enfim, esta historia ficou por aqui, somente com título, sem fim marcado. Como a vida, sabe? Pense bem, para não sofrer mais, a gente procura matar a dor para continuar a própria vida.