Não me deixe pra trás
E quando não havia mais esperança
eu simplesmente parei na beirada e olhei pra baixo. Nunca me senti tão leve. O
pânico era alheio, não meu. Olhei pra cima, estiquei os braços ao máximo que
consegui, como se eu sentisse que iria receber alguma bênção, e relaxei o corpo.
Os pés juntos, na beira da ponte, com os dedos quase totalmente para fora de
onde eu podia pisar com segurança, e eu não sentia nada além de alívio.
Por ali fiquei por segundos,
longos, parecia passavam lentamente. Poderia ter me irritado com isso, mas
naquele momento eu não queria mesmo que o tempo passasse. Aquela sensação de
liberdade deveria durar mais tempo... Meus cabelos longos me cegaram por momentos,
a brisa passou tão forte que eles se emaranharam em meu rosto. Não vi nada... e
não precisei, bastava sentir.
Continuei com os braços
lindamente esticados, me dando, perigosamente, uma instabilidade inapropriada
para o momento. Não liguei. Não entende que não era importante? Não me
importava com o perigo iminente, ou escancaradamente mortal, parecia, para mim,
apenas fugaz.
Fugaz! Pensei naqueles dias em que
pensei que seu carinho por mim seria menos efêmero. Duradouro, na verdade, isso
que achei. Este pensamento subitamente doeu-me o coração... se é que isso,
literalmente é possível. Pois é, com você aprendi que os fatos são como são,
não há maneiras de deixá-lo romântico o suficiente se uma das partes o torna cruel
por simples prazer. A sua partida foi muito cruel. Inesperada, desnecessária,
brusca...
Mesmo num estado de êxtase e
meditação angelical, o pensamento em você me fez sentir uma lágrima amarga
descer pelo rosto. O desequilíbrio chegou por momentos poucos; lembrar sua partida
egoísta me causou desconforto. Desci os braços junto ao corpo, realmente
procurando equilíbrio. Abri os olhos e percebi onde estava. Num estado de
lucidez apenas desci do parapeito. O barulho da água batendo nas pedras laterais
ficou ensurdecedor... o que antes era apenas quietude. Foi você, foi o
pensamento em você me trazia caos, imagine a presença...
Respirei fundo, bem fundo. Acho que
procurava a vida. Não sei, queria perdê-la, já tinha perdido você. Firmei as
mãos na beira da ponte, segurando-me firmemente, em mim mesma. Pensando que
este gesto externo me daria forças para achar-me internamente. Trêmulos, os
braços, me seguraram em mais um momento de lucidez. Como enxergaria minha
sombra como uma apenas se já me acostumara a vê-la como dupla? Mais lágrimas
densas e teimosas me desceram as bochechas. Caiam, aqui, agora e chega. Abro os
olhos e vejo apenas o horizonte à frente... Preparada para seguir em frente,
abri-me para os sentidos naquele instante. O primeiro passo para sair dali foi
duvidoso.
Inesperadamente sua voz surge ao
fundo. Inebriada pelas emoções dos últimos segundos, em que a decisão de
continuidade estava ainda delicada, escutei você ainda mais perto. Os olhos o
procuravam em várias direções e, mesmo sem vê-lo, sua voz já chegava como um
grito ao ouvido. Não tive mais dúvidas, senti-me forte o suficiente para
juntar-me a você. Fui, sem repensar. Não deixei vestígios. Apenas um corpo inerte,
já desfalecido pelo encontro com a água gélida.
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